Bom dia a todos.
É uma enorme alegria para mim estar aqui hoje. Uma alegria muito especial. Normalmente as ideias e as aspirações vão sempre muito mais além do que a realidade e é isso que constitui o movimento das sociedades. Acontece que eu, com tudo que estou a ver e que tenho vindo a acompanhar, sinto estar perante uma situação inversa. Esta ideia, de realizar um colóquio de estudantes de doutoramento, ultrapassou em muito a realidade da ideia do que podia ser a sua concretização. Ultrapassou muito, mas muito mesmo, e eu posso testemunhá-lo porque estive na origem dela e nunca imaginei que nós hoje estivéssemos aqui com este programa notável, que é uma lição para todos! Para professores, investigadores deste centro, de outros centros, de outras instituições.
Mas é também uma lição por toda a forma organizativa, muito bem construída, aberta à sociedade, ao contrário de outras que eu conheço no mundo. Dando a palavra aos estudantes, que era exactamente isso que devia ser feito, cabendo aos mais velhos serem, quando muito, comentadores e moderadores. Abrir o CES para fora e dar conta, de facto, da plenitude do trabalho que se faz naquele centro de investigação.
Esta iniciativa mostra bem a pujança desta instituição da Faculdade de Economia. E eu saúdo a presença do Professor José Murteira, aqui em representação do presidente do Conselho Directivo, e do Professor Carlos Fortuna, nosso investigador.
Quero salientar, antes de mais, a excelência do que estou a observar e que está presente em todos os detalhes. Um deles, por exemplo, é esse notável poster que já pedi, que eu preciso de um, quero um. É notável no título e no design que esteve por detrás desse título. São coisas pelas quais nós por vezes pagamos fortunas. Não sei quantas fortunas vocês pagaram, ao que sei nenhuma, para terem um poster de tanta qualidade, enquanto nós vamos, por vezes, pedir aos melhores designers e se calhar temo-los em casa e não os aproveitamos. Ou seja, uma contradição com o senhor Professor Boaventura de Sousa Santos que escreve livros contra o desperdício da experiência e depois a desperdiça dentro da própria casa! Acho que isto é uma grande lição para todos nós.
O título é absolutamente notável! Uma articulação do local e do global que não seria melhor, como metáfora do que estão a fazer. Encontrar “Coimbra C”: aquela que, sendo de escalas e transbordos, está para além das outras, precisamente porque é a estação que não existe. É aquilo que nós somos e onde ficamos, por algum tempo é certo, mas aí ficamos, para nos transformarmos por dentro e para transformarmos os outros por dentro e por fora, a nossa sociedade.
Queria-vos dizer duas ou três coisas que me vão no coração, que também me vão na alma, obviamente, mas são muito do coração. Estão muito juntas. Tivemos na semana passada um grande colóquio em Lisboa sobre a avaliação do Processo de Bolonha. Todos viram isso em páginas e páginas dos jornais, na televisão, etc. Quero dizer-vos que nós estamos aqui nesta sala, neste colóquio, a testemunhar o que há de melhor no Processo de Bolonha. Coimbra C é Bolonha A, por contraposição a Bolonha B, que é o gato por lebre que se está vender em Portugal como se fosse Processo de Bolonha.
O que se passa em Portugal é preocupante, apesar de os responsáveis estarem a tentar desenhar uma aguarela muito alegre dos acontecimentos. Como se nada fosse preocupante quando as universidades foram descapitalizadas, quando os professores estão num sistema perverso de Bolonha, em que os bons não podem ser melhores e em que os maus têm álibis para não parecerem aquilo que são. E isso continua como no sistema anterior. Mais, aumentou-se por vezes a rigidez. Aumentou-se o que deveria ser o contrário, que era a diversidade dos conteúdos, das opções, da personalização, da menor carga horária dos professores, da dignificação do ensino não expositivo e participativo, da possibilidade de estabelecermos contratos plurianuais com os professores que, durante um ano, ensinam mais e durante dois anos não ensinam porque estão a terminar um projecto. Tudo isso é possível em Bolonha. Está ser possível noutros países. Aqui não foi. Tradição burocrática, tradição ignorante, pouco conhecedora do que se está a passar no mundo. Tentou realmente fazer-se Bolonha pela rasteira. É o que domina no nosso país. E nós aqui na Faculdade também não estamos livres exactamente disso. Portanto, é bom que saibamos que as faculdades e as instituições são contraditórias e permitem isto. E isto é o melhor.
O ensino na investigação, a investigação no ensino. Isso é Bolonha! Porque só isso permite a participação dos estudantes, só isso permite a diversificação dos conteúdos, só isso permite a tutela pessoal. Obviamente com poucos alunos. Dizia no outro dia o Doutor Alberto Amaral: “Como posso ter uma tutoria especial e personalizada se tenho 70, 80 alunos na sala? Como é que posso trabalhar para que os professores se motivem mais no Processo de Bolonha se as suas carreiras estão bloqueadas?” Vemos jovens de 30 anos que podem ficar toda a vida como professores auxiliares. E esse bloqueio está patente também nos investigadores do laboratório associado que podem ver as suas carreiras bloqueadas. Tudo gente que não vai chegar a catedrático, provavelmente. E que por vezes é proletarizada de alguma forma. Parece existir um sistema de vigilância, de desconfiança contra os professores. E às vezes contra os melhores! Faz-se porque o tratamento é burocrático, porque não se fazem as análises pelos programas. Se um programa tem dado bons resultados merece alguma flexibilidade, se um programa tem dado menos resultado merece menos flexibilidade.
É uma outra cultura de mentalidades que está muito longe, e eu digo-o hoje, aqui, porque não gosto de ser derrotista nem de não ter alternativas. E hoje é a primeira vez que falo sobre isto em Portugal, apesar de ter escrito um livro sobre Bolonha, sobre a Universidade no Século XXI. Tenho falado em outros países. E falo hoje porque tenho alternativa. E a alternativa é isto! Sois vós que, realmente, nos últimos anos nos ajudaram. E muitos de vós, provavelmente, estão fartos de me ouvir, porque na vossa carreira, a grande maioria passou por mim desde a licenciatura, pelo mestrado e alguns no doutoramento. Outros são meus queridos amigos de há muitos anos que estão aqui e que me acompanharam nessa história recente. Estes estudantes, de uma forma maravilhosa, foram buscar pessoas como meu querido amigo Alberto Melo, como o Fernando Nobre, como o Nuno Portas, tão difíceis de trazer às instituições. Como é que os trouxeram? Se nós por vezes organizamos coisas, convidamos, e eles não vêm?! Porque eles viram que realmente havia aqui qualquer coisa de novo. E o que havia de novo é o modo extraordinário como uma instituição se sabe reproduzir. E a responsabilidade enorme que ela tem agora, porque é esta juventude que está aqui, com trabalhos, cuja qualidade pode ser variável, mas em geral é muito boa. É essa que amanhã é uma responsabilidade para o CES, para pode acompanhá-los na sua vida, para poder eventualmente trabalhar com eles a diferentes níveis, para serem eles, de alguma maneira, o caminho da sua própria expansão. É preciso ver que tudo isto foi possível, precisamente por estas iniciativas que lançámos, de doutoramentos temáticos, com poucos alunos.
O CES acabou por especializar-se nos Doutoramentos para poder vincular, como Bolonha quer, a investigação e o ensino de uma maneira cada vez maior, porque é essa que promove os estudantes. E fizemos isso por uma razão, e essa também não convém esquecer aqui: é porque desde 2002/2003 o CES é um laboratório associado. E essa pujança que temos aqui só foi possível porque contratámos vinte e tal investigadores do laboratório associado, pessoas que não estão institucionalmente ligadas à universidade e que, portanto, todo o trabalho que realizam em termos lectivos pode dizer-se que entra a custo zero para a Faculdade. Por incrível que pareça, tivemos problemas para fazer aceitar isso numa Faculdade que se vê fechada e para quem os únicos professores são os seus. Isto em pleno século XXI, no tempo da mobilidade de professores e de estudantes por todo o mundo, por toda a Europa. Ainda pensam que aqueles que estão ali, não sendo professores da Faculdade, não devem ser tratados como professores. Até os funcionários, por vezes, tomaram essas atitudes.
Acho que é bom que se diga isto, porque aqui há também alternativas. Conquistámos muito nestes anos. Talvez saibam que a maior parte dos investigadores do laboratório associado do CES são estrangeiros, muitos deles falam português, outros nem isso. Não conhecem as peculiaridades e muito menos as particularidades, as asininas da nossa burocracia e, portanto, há que explicar, que trazer tudo isso à colação. Foi um esforço extraordinário, porque foram contratados, e realmente, na altura não se falava muito de pós graduação, falava-se de investigação. Hoje, no entanto, todos eles são professores nestes programas e foram eles que os tornaram possíveis em boa medida, naturalmente com os professores da Faculdade de Economia, todos juntos, como sempre quisemos. Isto é, não se separa a investigação do ensino!
Penso que na nova legislatura, outras mudanças vão ocorrer na Faculdade de Economia, e sei que vamos entrar num novo ciclo. Não é por acaso que estamos aqui. O CES vai estar muito mais presente na Faculdade de Economia e temos ideias concretas. Nós temos hoje coisas notáveis de que todos os estudantes da Faculdade de Economia, sejam do CES ou não sejam, sejam do primeiro ciclo ou do segundo ciclo têm que beneficiar. Sabemos hoje que Bolonha, por exemplo, pede a diversificação dos sistemas pedagógicos.
Temos um acervo de documentários sociológicos, como se diz nos Estados Unidos, sobre vários temas, que muito provavelmente não vamos apresentar no CES, vamos trazê-los para aqui, para que todos os estudantes venham, e para que venham realizadores de filmes falar connosco. Já temos dois ou três deles na calha e os estudantes vão ter a possibilidade, em diferentes línguas, de interagir. Como nós temos, aliás, realizadores de documentários entre os nossos estudantes. É esta capacidade de integração entre uma instituição de investigação e uma faculdade, entre o ensino e a investigação, que penso Bolonha permite de uma maneira extraordinária e nós não aproveitámos isso!
Vejo os meus colegas mais novos, por vezes com saúde já afectada pelo excesso de aulas, que em vez de serem criativas se tornam expositivas e repetitivas, não ficando com muito tempo para a investigação. Eu penso que nós, na nossa instituição, conseguimos de alguma maneira evitar isso. Precisamente porque tínhamos apenas o doutoramento e, portanto, menos gente. E é este benefício e essas condições que nós queremos transladar para o conjunto da Universidade. Aqui na Faculdade e no Instituto Interdisciplinar de Investigação, que vamos ter na nossa Universidade. Esta é a nossa mensagem, a nova relação entre o CES e a Faculdade de Economia. Entre a investigação e o ensino, para que se enriqueça no seu conjunto e não apenas os estudantes de Sociologia, ou os estudantes de Economia, de Gestão. Todos! Os de Relações Internacionais, têm vindo a trazer para o CES o documentário sociológico, multimédia, e outras formas de aprendizagem que não passam pela literatura livresca.
Penso que estamos num caminho extraordinário e sois vós que estais a apontar esse caminho. Quando se liberta a iniciativa dos estudantes, isto de novo é Bolonha! Bolonha é que o estudante seja responsável pelo seu currículo e o organize também. Nós ainda não temos muitas possibilidades disso, mas nós lançámos uma ideia, demos-vos algum dinheiro e o resultado está aqui. E não foi muito o dinheiro que foi dado para permitir tudo isto. Foi algo com aquele espírito de ebulição próprio dos estudantes brilhantes que dizem: “nós se calhar ainda vamos fazer melhor do que eles”. Isto porque são muito críticos, por vezes, das coisas que a gente faz. E nós vamos ser críticos também. Disto podem estar certos, mas para quê? Para melhorar! E há muita coisa que pode melhorar. O que pode melhorar?
Eu acho que estamos num país cheio de fantasmas e de ideias feitas, a partir das quais não se avança. Não podemos avançar neste país. E digo isto porque estamos num processo de transformação, quer da faculdade, quer do país, que deve ser encarado: se não se refinanciarem as universidades a curtíssimo prazo, isto é um desastre obviamente. Mas se as universidades não se repensarem também, dentro da margem de manobra que têm, o desastre será fatal.
Como disse, em Bolonha é possível organizarmos planos de trabalho de professores plurianuais. Não é preciso dar seis, doze horas lectivas por ano. Pode ser dar zero num ano e dar vinte no ano seguinte, se isso for contratualizado com a faculdade e houver interesse nisso. Porque têm que fazer trabalho de campo, têm que fazer relatórios, têm que escrever um livro. Temos que escrever livros e temos que os escrever em todas as línguas. O futuro está aqui. E este momento novo é novo porque é também, de alguma maneira, uma ruptura com as concepções retrógradas da Universidade. E é também uma prova de que se pode fazer melhor, num momento em que as condições objectivas podem ajudar. No caso da tutela, efectivamente, penso que hoje é claro para o país que as Universidades foram muito sacrificadas nesta última legislatura: 16% de cortes orçamentais é violento! As universidades foram tidas como corruptas, como más administradoras, como desperdiçadoras de bens, quando hoje se prova por relatórios da OCDE, que nem sempre são muito favoráveis à universidade, que não é tanto assim e que, pelo contrário, até administram bem. Não têm é, por vezes, o suficiente.
Claro que há muita mediocridade instalada. Há aqueles que não fazem investigação e não gostam daqueles que fazem investigação. E quase sempre sacrificam os melhores, para não se notar tanto a distância entre eles. Mas isto existe em qualquer instituição. E, portanto, eu gostaria que isto fosse algo novo. Onde é que pode ser novo?
Falaram aqui numa associação. Muito bem, pois aqui temos esta oportunidade extraordinária e uma novidade.
Há cerca de vinte anos (talvez alguns não saibam), fui durante doze anos presidente do conselho científico desta Faculdade. Criei-a, desde 1973, praticamente a pulso. Esta associação tem algo de verdadeiramente diferente. Vocês vão ser a nossa verdadeira comissão de acompanhamento. Observar ao longo do ano o que estamos a fazer no CES pelos contactos que têm enquanto alunos de doutoramento e pós- doutoramento e, a partir daí, dizer-nos o que é que está bem e o que é que está mal.
Uma comissão de acompanhamento séria! Que faça sugestões de mudanças que temos de fazer, sugestões que podem, inclusivamente, conduzir a mudanças concretas. Esta comissão de acompanhamento, para mim, é absolutamente fundamental.
Outra questão. Vejam como se fala hoje, em Portugal - e isso também é outra coisa de Bolonha, obviamente, e que foi feito sem pensar muito nas sociedades semiperiféricas como Portugal - que é a preparação dos estudantes para o emprego. Nós sempre achámos que isto era uma falácia numa economia semiperiférica como a portuguesa. E agora estamos a ter os resultados. Os estudantes do primeiro ciclo têm muitas dificuldades de empregabilidade. E isto não acontece por sermos semiperiféricos. Acontece na Alemanha, sendo mais avançada. Foi assim que isto se fez para que o segundo ciclo fosse, de facto, o final de uma formação profissionalizante. Mas é verdade que esta formação exige, realmente, uma adaptação ao emprego.
Bem, quem é que nos pode dizer melhor as tendências de empregabilidade do que os nossos estudantes que estão aqui com doutoramento, neste país ou que foram para outros países? Onde é que estão as novas ideias? Onde é que se está a contratar mais gente? Porque é que os licenciados estão a ficar sem emprego num país que vai cada vez ter mais licenciados a ser chauffeurs de táxi e outros casos assim? Por que é que isto é possível?
Acho que ninguém melhor do que eles nos pode dizer porquê.
Porque a falácia é esta. No fundo, não podemos preparar a Universidade para o emprego e para o mercado de trabalho. Temos é que preparar o mercado de trabalho para a Universidade. E disso ninguém fala, porque se trata de uma transformação profunda na economia. Os nossos empresários não podem estar a lutar sempre e só por baixos e precários salários. Os dados do PNUD são, neste caso, absolutamente extraordinários! Em cada dez novos empregos que se criaram há dois anos, sete são no sector informal. Já viram um licenciado, com mestrado ou com um doutoramento ir para o sector informal? É assim!
Porque há desemprego de licenciados? Por esta razão! De dez empregos novos criados, sete são no sector informal, a nível mundial. Este é o contexto político, económico, nacional e internacional em que nos movemos.
Eu penso que nós temos aqui, à nossa frente, o que vai ser, o que pode ser, se tivermos capacidade de integrar. Penso que a integração dos nossos investigadores, nos laboratórios associados, está, neste momento, a 10% do que pode ser. Com a colaboração dos estudantes e dos pós-doutorandos pode ser muito mais. Lembrem-se que nos Estados Unidos muitas das aulas são dadas, e com qualidade, pelos chamados TA’s. Os TA’s são os teaching assistants. Os teaching assistants são estudantes, são doutorandos, são pós-doutorandos. Claro que, obviamente, são organizados. Têm um sindicato, porque têm que ganhar dinheiro por isso. E o dinheiro não tem sido suficiente e eles lutam exactamente por isso. Na universidade de Madison são treze, que não é muito, são treze que ganham catorze dólares por hora, que não é muito para um TA. Quando a universidade procurou reduzir esse salário houve greve dos TA. E quando há uma greve de TA, a universidade pára. Isto mostra o poder que hoje têm essas pessoas. Não é para dizer que os professores se devem demitir. Os professores devem ser apoiados. São eles que fazem investigação. Todo o professor deve ser investigador. Verei com muita tristeza uma divisão entre o professor investigador e o professor que dá aulas. A menos que a pessoa, por opção, tenha decidido que já deu o que tinha a dar na parte da investigação e nada tem a dizer. Então, essa pessoa não pode ter seis horas de aula, doze horas de aulas. Deve ter vinte ou vinte e quatro, para que outro possa ter menos para fazer investigação.
Para concluir, e desculpem ter aproveitado esta intervenção para fazer uma reflexão sobre o Processo de Bolonha, mas feriu-me muito o discurso público róseo que decorreu em Portugal na última semana sobre este processo, totalmente triunfalista e sem reconhecer as mazelas profundas de um sistema que não criou as condições para que as universidades continuassem a fazer aquilo que já faziam bem, e que passaram até a fazer pior.
Precisamos de um refinanciamento das Universidades e não da sua descapitalização. Como é que nós podemos dar o mesmo que Salamanca? Damos, porque somos maravilhosos e entusiasmados, somos grandes profissionais e grandes entusiastas, estudantes e professores! Damos o mesmo que Salamanca, que por cada estudante recebe o dobro da Universidade de Coimbra por parte do Estado. O dobro em paridade do poder de compra! É fazer muito com pouco. Mas há limites para isso! A miséria tem uma grande dignidade, mas abaixo dessa dignidade, abaixo de um certo limite, é miséria mesmo e essa não tem dignidade.
É com muito gosto que eu vejo este colóquio e vos digo mais – e esta é a última sugestão que vos faço. Este ano foi um ano de grande criatividade para o CES. Estamos em fase de consolidação, porque nós neste momento não prevemos grandes ampliações do nosso quadro de investigadores. Somos hoje uma instituição internacionalmente conhecida e reconhecida. O país está meio suspenso. Estou aqui com o telefone parado porque estão os jornalistas atrás de mim, exactamente para saber quando é entregue ao Ministro da Justiça o relatório de monitorização do código penal e do código do processo penal, onde avançamos com as nossas propostas. Está o país judiciário suspenso do que vai sair deste centro, basicamente, de uma equipa de trabalho que está há dois meses em permanência a trabalhar e a formar julgados de paz aqui em Portugal. É, portanto, esta responsabilidade pública que nós temos e vamos, realmente, ter cada vez mais.
Para além disso, temos vindo a ampliar-nos, porque estamos a consolidar a instituição. Mas a ampliar-nos institucionalmente de uma maneira que seja leve. Isto é, que seja uma ampliação que não crie custo à instituição, através da criação de unidades que são autónomas do ponto de vista financeiro e administrativo. Foi assim que, em Julho, se criou o CES-América Latina, dirigido pelo nosso querido amigo Leonardo Avritzer. Não nos ocupam, não dependem de nós, vão estar sozinhos. Mas têm a mesma lógica, a tal escola de que nos falava o José Manuel Mendes. Vão ter a mesma escola, a mesma influência e também uma coisa que estamos a fazer e que é inédita em Portugal: uma transf erência de tecnologia solidária. Portanto, enquanto a tecnologia, por exem plo, do Observatório da Justiça e de outros observatórios é vendida a preço de mercado ao PNUD, foi assim que a vendemos recentemente ao PNUD, para o CES-América Latina é transferida gratuitamente. E vamos transferi-la também para Moçambique, de onde acabo de chegar. Cheguei ontem do Maputo, onde fui com a Doutora Paula Meneses lançar o CES-Aquino de Bragança, que será o CES-África, também uma organização fraterna, autónoma do ponto de vista financeiro e administrativo, em homenagem a um grande internacionalista, a um grande lutador pela libertação anti-colonial e, portanto, a uma pessoa com grande respeito, um grande inovador teórico e político: Aquino de Bragança . Deste modo, dispomos hoje de uma rede internacional onde amanhã o colóquio dos estudantes de doutoramento pode ir buscar também alguma energia.
Deixo aqui uma nota final. O dia 11 de Setembro, uma data que não é muito agradável em Portugal e no mundo (existem muitas outras datas que deveriam ser analisadas, mas ninguém olha para elas: o 11 de Setembro foi, por exemplo, a data da morte do Allende, da qual ninguém fala ), foi também a data em que inaugurámos o CES-Lisboa. Temos hoje uma sede, não se trata de um centro autónomo, mas de uma sede do CES-Coimbra, em Lisboa. Um espaço extraordinário, com um anfiteatro, através de uma cooperação com a Câmara Municipal de Lisboa e com um espaço próprio onde podemos organizar sessões paralelas com cerca trinta pessoas e seminários para formação. É aí que vamos fazer alguma da formação. Como disse na inauguração, pelo facto de estarmos em Coimbra, por vezes temos dificuldade que alguns dos nossos formadores, e até formandos, venham cá. Pois se Maomé não vai até à montanha, a montanha vai até Maomé. E lá fomos! E foi uma sessão extraordinária onde esteve muita gente do CES, muita gente de fora do CES, que eu nunca imaginaria que estivesse connosco nessa iniciativa. Eu penso, quem sabe se há já uma sugestão, que o próximo colóquio pode realizar-se no CES-Lisboa e então será uma bomba no meio de Lisboa, com o CES-Lisboa a albergar o colóquio dos estudantes de doutoramento do CES e com a sua associação virada exactamente para retroalimentar a sua instituição.
Vejam se organizam na vossa associação a possibilidade de virem a Coimbra uma semana. Venham que nós, com o que me posso comprometer, como instituição e como director do CES, vamos estar atentos, aprofundar um caminho novo, que iniciamos provavelmente amanhã, através da nossa relação com a Faculdade de Economia, com a Universidade, com o Instituto 3I’s, para que tudo isto seja possível. E vejam se realmente nós estamos à vossa altura para dar essa formação, de maneira inovadora. Em que gente que tenho aqui, que estou a ver e que conheço bem, vai ter uma forma inovadora de nos dizer: “Nós queríamos um curso, um crash course de 4 horas, de 6 horas sobre este tema, vocês tem aí alguém? Se não têm inventem! Se não têm, a gente tem! E a partir daí o CES pode ter uma outra dimensão. E com ele a Faculdade de Economia pode ter uma outra dimensão de formação. Essa diversificação de conteúdos, de que falava Marçal Grilo. É exactamente isto que penso que nós vamos fazer.
Peço-vos desculpa porque comecei a dizer que todos me ouviram muito durante tantos anos, e falei agora de tantas coisas quando realmente não queria ter falado muito. Mas Bolonha estava-me, de facto, atravessada, porque vejo tanta mediocridade a passar por coisa boa que me custa ver uma coisa boa e não assinalá-la como deve ser.
Fica assinalada e dou-vos os parabéns, aconteça o que acontecer. A menos que haja um terramoto ou um Tsunami, este colóquio já é um êxito. Saúdo-vos por isso.
Vamos estar por aqui, vai ser um trabalho árduo, mas também um trabalho profissional, afectivo, de grandes emoções e de grande qualidade científica.
Desejo-vos, pois, um bom colóquio!
Muito obrigado. |