Editorial
Neste número da revista Cabo dos Trabalhos
reúne-se uma seleção de ensaios produzidos por estudantes
no âmbito de unidades curriculares do Programa de
Doutoramento em Sociologia: Relações de
Trabalho, Desigualdades Sociais e Sindicalismo ao
longo do ano letivo 2016-17 (coincidindo com a 5ª edição
deste programa doutoral).
Os ensaios aqui apresentados dão testemunho
de compromissos com temas e problemáticas que vêm sendo
objeto de debate neste Programa de Doutoramento. Além
disso, reforçam a faceta internacional do programa, não só
porque reúnem contributos de estudantes de distintas
nacionalidades, como porque tais ensaios se debruçam sobre
matérias que têm por referência diferentes contextos e
enquadramentos geográficos, sociais, políticos, culturais
e económicos. Assim sendo, os ensaios apresentados neste
número da Cabo dos Trabalhos versam sobre: a
representação sindical parlamentar; a crise do
sindicalismo; as teorias e ideologias sindicais; o papel
do direito na construção de direitos das mulheres; o
acesso a direitos e o lugar das políticas públicas
orientadas para pessoas com deficiência; os impactos da
globalização; as transformações no setor das pescas; e as
recomposições da classe média.
Do ponto de vista da sua organização
formal, a sequência por que aparecem os ensaios obedeceu a
um critério de proximidade temática que encontrámos entre
eles. Assim, destacamos, por um lado, um conjunto de
artigos centrados no fenómeno sindical, ainda que olhado
sob diferentes primas. Por um lado, o ensaio de Davilson
Marques Cunha, ao dar conta das articulações entre
sindicalismo e partidos políticos, procede a uma análise
do (re)posicionamento da representação sindical
parlamentar (na Câmara dos Deputados) no quadro do
processo que aprovou o impeachement lançado
sobre a então presidente do Brasil, Dilma Roussef.
Se no ensaio anterior já se problematizava
uma eventual crise de identidade do sindicalismo, no
artigo de Deise Aparecida Recoaro aprofunda-se a reflexão
sobre a crise do sindicalismo à luz de uma análise
comparada entre as experiências brasileira e portuguesa.
Partindo de autores que nos dois países têm investigado
sobre o assunto, procura-se uma identificação de pontos
comuns e divergentes entre as duas realidades.
Ainda focado no fenómeno sindical, o texto
de Maria Antónia Mota procura recuperar algumas teorias e
compromissos ideológicos do sindicalismo, quer numa
perspetiva sociohistórica, quer suscitando alguns
elementos de problematização no quadro do designado
sindicalismo “independente”, mormente do setor bancário.
Além da leitura conjunta/articulada que
pode fazer-se destes três ensaios anteriores, dois outros
ensaios são passíveis de agrupar-se, sobretudo pelas
fronteiras que suscitam entre os campos da sociologia e do
direito (ou da construção de direitos). Por um lado, o
ensaio de Glória Leite procura balizar temporalmente o
papel das lutas de mulheres bem como os contributos da
sociologia do direito para a construção de avanços nos
processos de igualdade. Além disso, e tendo por referência
o contexto brasileiro, a autora faz uma incursão por
várias formas de violência de que as mulheres são vítimas
e das quais procuram libertar-se com o intuito de se
constituírem como sujeitos do próprio direito.
Por outro lado, Márcia Borges toma como
foco da sua análise as pessoas com deficiência,
frequentemente excluídas do acesso aos direitos básicos.
Nesse sentido, a autora questiona qual tem sido a resposta
(ou ausência dela) por parte do Estado (designadamente do
Estado brasileiro) nesta matéria, procurando ainda indagar
qual o espaço de participação cidadã na definição dessa
crucial agenda de inclusão social.
Nos derradeiros três ensaios encontramos
também pontos de contacto relacionados com os processos de
globalização, liberalização e austeridade. Por um lado,
Maria Raimunda Mendes, socorrendo-se dos discursos da
Organização Internacional do Trabalho, analisa os impactos
da globalização nas relações de trabalho. As questões da
inovação tecnológica e suas articulações com as
desigualdades sociais e processos de precarização são,
entre outros, alguns dos tópicos analisados no texto.
Por sua vez, o ensaio de João Delgado não
deixa de se centrar, numa perspetiva crítica, sobre os
desafios decorrentes do processo de liberalização das
pescas. Ao deter-se no caso português (mais concretamente
na comunidade piscatória da Nazaré) sugere que as relações
de interdependência entre produção e comercialização
apontam para um desequilíbrio na repartição do valor
gerado ao longo da cadeia de valor dos produtos da pesca.
Por fim, o ensaio de Rui Claro analisa os
impactos das políticas de austeridade nos processos de
reconfiguração de classe. Além de rediscutir teoricamente
o conceito de “classe média”, interroga-se sobre as
implicações dos protestos anti-austeridade sobre a classe
média.
Além do núcleo duro composto pelos ensaios,
neste número da Cabo dos Trabalhos
disponibilizamos ainda integralmente a gravação de uma
mesa redonda internacional que a coordenação do programa e
o projeto “Rebuilding trade union power under austerity
age: three sectors under review” (PTDC/IVC-SOC/3533/2014 -
POCI-01-0145-FEDER-016808) organizaram em 9 de junho de
2017, na FEUC. Intitulada “Os desafios atuais do trabalho
na União Europeia”, esta mesa redonda contou com um painel
de oradores internacionais muito conceituados: Richard
Hyman (professor emérito da London School of Economics and
Political Science), Klaus
Dörre (Universidade Friedrich-Schiller e “visiting
scholar” da FEUC em 2016-2017), Rebecca
Gumbrell-McCormick (Senior Lecturer in Management do
Birbeck University of London) e Florian Butollo (Assistant
Professor, Institute of Sociology, Jena, Universidade
Friedrich-Schiller).
dezembro de 2017
Hermes Augusto Costa
Elísio Estanque
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